quarta-feira, 3 de março de 2010

Regras e metas da educação até 2020

> Estado de Minas, 03/03/2010 -

Belo Horizonte MG Glória Tupinambás
São Paulo – O Brasil está diante de um momento decisivo: construir um novo Plano Nacional de Educação (PNE) para aos próximos 10 anos (2011-2020). As bases que vão compor o documento, que dita regras e cria metas para o ensino público e privado do país, foram discutidas ontem, na capital paulista, num encontro promovido pelo Movimento Todos Pela Educação. Durante a reunião, especialistas em ensino, autoridades do Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Educação apresentaram os 10 grandes obstáculos que o Brasil precisa superar para garantir a todos uma escola de qualidade. Entre os desafios, estão extinguir o analfabetismo; ampliar o investimento em educação pública, atingindo 10% do PIB até 2014; valorizar os profissionais da educação; implantar a escola de tempo integral na educação básica; universalizar o atendimento público e gratuito da pré-escola, ensino fundamental de nove anos e ensino médio; democratizar a oferta de vagas no ensino superior; expandir
a educação profissional; garantir oportunidades para estudantes com deficiência, indígenas, afro-descendentes e povos do campo; implantar o Sistema Nacional de Educação, em regime de colaboração entre União, estados e municípios; e estabelecer padrões de qualidade para cada modalidade de educação. A principal cobrança feita pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) foi para que o novo PNE traga instrumentos para punir os agentes públicos que não cumprirem os compromissos firmados. “A lei deve ser mais que um conjunto de objetivos e metas. É preciso encontrar mecanismos que obriguem e deem prazos para que municípios, estados e a União cumpram as regras”, diz César Callegari, presidente da Câmara de Educação Básica do CNE. O pedido foi reforçado pelo secretário executivo adjunto do MEC, Francisco das Chagas, que assumiu que o atual plano, em vigor desde 2001, anda meio esquecido. “Vamos divulgar, essa semana, o documento-base com propostas
vindas das conferências estaduais e municipais. O texto vai servir de referência para o novo plano que está sendo construído e precisa ser articulado em regime de colaboração e cooperação”. O novo PNE volta a ser discutido durante a Conferência Nacional de Educação, entre os dias 28 de março e 1º de abril, em Brasília. Em seguida, o MEC deve consolidar, até maio, um documento com as diretrizes que será encaminhado ao Congresso Nacional, para votação até o fim do ano. O presidente executivo do Movimento Todos Pela Educação, Mozart Ramos, reforçou a necessidade de estipular poucas metas e prazos curtos para facilitar o acompanhamento. “Defendemos metas objetivas, par que a sociedade possa entender e monitorar de perto. Além disso, é preciso que elas sejam estabelecidas ano a ano, pois assim é possível medir esforços e conhecer os avanços num tempo menor”. *A repórter viajou a convite da organização do evento.


País só cumpre 33% de metas de educação
> Folha de São Paulo, 03/03/2010 - São Paulo SP

Relatório mostra que ainda há alta repetência, a taxa de universitários é baixa e o acesso à educação infantil está longe do proposto. Estudo de pesquisadores de universidades federais abrange o período de 2001 a 2008, incluindo dois anos de governo FHC e seis de Lula

ANGELA PINHO / LARISSA GUIMARÃES DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Enquanto petistas e tucanos fazem alarde dos seus feitos na educação, um dos levantamentos mais abrangentes já realizados sobre a última década revela que os avanços na área foram insuficientes. Apenas 33% das 294 metas do Plano Nacional de Educação, criado por lei em 2001, foram cumpridas. Relatório obtido pela Folha, feito sob encomenda para o Ministério da Educação, aponta alta repetência, baixa taxa de universitários -apesar dos programas criados nos últimos anos- e acesso à educação infantil longe do proposto. O estudo, que abrange o período de 2001 a 2008, foi feito por pesquisadores de universidades federais, com apoio do Inep (instituto de pesquisa ligado ao MEC). O plano foi criado com o objetivo de implantar uma política de Estado para a educação que sobrevivesse às mudanças de governo. As metas presentes nele são de responsabilidade dos três entes federados, mas municípios têm mais atribuição pela educação infantil e fundamental; Estados, pelo ensino médio; e a
União, pela articulação de políticas. O estudo traz indicadores relativos ao período de 2001 a 2008 -dois anos de governo FHC e seis de Lula. Para muitas metas, não há nem sequer indicador que permita o acompanhamento da execução. Em outros casos, em que há indicadores claros, há um longo caminho pela frente. A educação infantil é um exemplo. O plano previa que 50% das crianças de 0 a 3 anos estivessem matriculadas em creches até 2010. É o que a faxineira Adriana França dos Reis, 32, desejava para sua filha, que chegou aos quatro anos sem conseguir vaga. "Quanto mais cedo ela entrar na escola, sei que mais longe ela vai chegar", diz. Segundo o IBGE, só 18,1% das crianças de até três anos estavam em creches em 2008. Já o ensino fundamental foi quase universalizado e aumentou de oito para nove anos. No ensino médio, o obstáculo é já no atendimento. Na faixa etária considerada adequada para a etapa (15 a 17 anos), 16% estão fora da escola. Na educação superior, o plano estabelecia uma meta de 30% dos jovens na universidade. Em
2008, o índice estava em 13,7%. O objetivo número um na educação de jovens e adultos, a erradicação do analfabetismo, está longe de ser alcançado. O Brasil ainda tem 14 milhões de pessoas de 15 anos ou mais que não sabem escrever. Para João Oliveira, professor da UFG (Universidade Federal de Goiás) e um dos responsáveis pela pesquisa, uma das principais causas dos problemas na execução do PNE foi o veto à meta que previa um aumento expressivo nos recursos destinados à educação: 7% do PIB em educação até 2010. Prevista na proposta aprovada no Congresso, foi vetada por FHC, que terminou seu mandato com um investimento de 4,8%. A decisão do tucano foi duramente criticada por petistas, que, em 2007 (dado mais recente disponível), já no poder, tinham aumentado o percentual apenas para 5,1%. Sem financiamento, diz Oliveira, o plano acabou perdendo força, pois impôs deveres aos governos sem viabilizar recursos para o cumprimento deles.

Plano avança em itens como financiamento e avaliação de alunos

> Folha de São Paulo, 03/03/2010 - São Paulo SP

Introdução do Fundeb e fim da desvinculação de parte da receita da educação levaram mais recursos para o setor. Ampliação da escolaridade obrigatória fez as matrículas aumentarem na faixa de 4 a 6 anos; todos os alunos e escolas públicas são avaliados DA SUCURSAL DE

BRASÍLIA
Embora o quadro geral seja negativo, o balanço do PNE (Plano Nacional de Educação) também mostra alguns avanços e não capta efeitos de medidas adotadas mais recentemente, já que os dados utilizados vão de 2001 a 2008. Um exemplo é o Fundeb (fundo de desenvolvimento da educação básica). Instituído em 2007, ele substituiu o Fundef, que cobria apenas o ensino fundamental, e passou a colocar recursos também para outras etapas que haviam ficado em segundo plano -a educação infantil, o ensino médio e a educação de jovens e adultos (antigo supletivo). A injeção de recursos da União para os Estados mais pobres saiu de R$ 500 milhões para R$ 5 bilhões. No ano passado, outra boa notícia para o financiamento foi o fim da DRU (Desvinculação de Receitas da União) para a educação. Instituído em 1994, o mecanismo permitia que o governo gastasse em outras
áreas até 20% da receita vinculada à educação, o que tirava do setor R$ 10 bilhões por ano. A mesma emenda que acabou com a DRU trouxe outro avanço: a ampliação da escolaridade obrigatória, que passou dos 7 a 14 anos de idade para 4 a 17 anos. Na faixa etária de quatro a seis anos, também houve um movimento positivo: o número de matrículas aumentou e deve cumprir a meta até 2010, saindo de 61,2% no ano 2000 para 79,8% em 2008, o que coloca o país muito próximo da meta de 80%. O monitoramento do PNE aponta que o Brasil evoluiu também na avaliação da aprendizagem. O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) consolidou o Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) que havia sido criado por Fernando Collor (1990-92), mudando a metodologia da prova para que fosse possível compará-la ano a ano. Sob Lula, o processo se
aprofundou, e a prova deixou de ser amostral para avaliar todos os alunos e dar uma nota para cada escola pública do país. Informado sobre o teor da reportagem, o Ministério da Educação afirmou que o relatório é preliminar e que novos dados deverão ser acrescentados posteriormente na avaliação que a pasta faz sobre o PNE. O MEC prometeu dobrar o atendimento de crianças em creches até 2010 -o que deixará o país fora da meta do mesmo jeito. Em relação ao ensino fundamental, lembrou que, pela primeira vez, foi registrada uma melhoria na qualidade: a nota subiu de 3,8, em 2005, para 4,2 em 2007. Em relação ao ensino médio, o MEC comemorou o fato de que, após as taxas de matrícula ficarem anos estagnadas, aumentaram dois pontos percentuais na última medição feita pelo IBGE. Segundo o instituto, em 2008, 84% dos adolescentes de 15 a 17 anos estavam na escola, contra 82% em 2007.


Projeto misturou metas irrealistas e outras factíveis
> Folha de São Paulo, 03/03/2010 - São Paulo SP

ANTÔNIO GOIS DA SUCURSAL DO RIO
O Plano Nacional de Educação é uma oportunidade única para que a sociedade civil possa debater com o poder público os rumos da educação brasileira. Para que não vire letra morta, há importantes reflexões a serem feitas sobre o que ocorreu com o último PNE, aprovado em 2001 pelo Congresso. A primeira delas é que falhamos todos na tarefa de popularizar seus objetivos e metas. É bem verdade, porém, que a redação do plano dificultava a missão. Com centenas de objetivos a serem atingidos, era quase impossível identificar as
demandas prioritárias. Outra lição importante é que metas irrealistas trarão poucos resultados, além da sensação de fracasso. O caso mais emblemático talvez tenha sido a ampliação das creches. Em 2001, apenas 9% das crianças de zero a três anos estavam na escola. A meta era 50%, mas ficamos longe disso. Não há dúvida de que demos pouca ou nenhuma prioridade à primeira infância, mas o objetivo era ousado até mesmo para países desenvolvidos. De uma relação de
28 nações listadas pela OCDE (organização que congrega, em sua maioria, países desenvolvidos), apenas duas, Dinamarca e Islândia, tinham mais de 50% de sua população de zero a três anos em creches em 2005. Por outro lado, parecia viável reduzir a taxa de repetência -já absurda até para padrões de nações pobres africanas- pela metade. Em vez disso, verificamos aumento. Para popularizar o próximo PNE, ajudará muito ter um texto com prioridades claras e metas alcançáveis e mensuráveis.

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